quinta-feira, 11 de novembro de 2010

COMPUTADOR AUXILIANDO O PROCESSO DE MUDANÇA NA ESCOLA


INTRODUÇÃO
Estamos praticamente vivendo na sociedade do conhecimento onde os processos de aquisição do conhecimento assumem um papel de destaque exigindo um profissional crítico, criativo, reflexivo e com capacidade de pensar, de aprender a aprender, de trabalhar em grupo e de se conhecer como indivíduo. Cabe à educação formar esse profissional. No entanto, a educação capaz de formar esse profissional não pode mais ser baseada na instrução que o professor transmite ao aluno mas, na construção do conhecimento pelo aluno e no desenvolvimento dessas novas competências.
 Uma das tentativas de se repensar a educação tem sido feita por intermédio da introdução do computador na escola. Entretanto, a utilização do computador na educação não significa, necessariamente, o repensar da educação. O computador usado como meio de passar a informação ao aluno mantém a abordagem pedagógica vigente, informatizando o processo instrucional e, portanto, conformando e fossilizando a escola. Na verdade, tanto o ensino tradicional quanto sua informatização prepara um profissional obsoleto.
Por outro lado, o computador apresenta recursos importantes para auxiliar o processo de mudança na escola - a criação de ambientes de aprendizagem que enfatizam a construção do conhecimento e não a instrução. Isso implica em entender o computador como uma nova maneira de representar o conhecimento provocando um redimensionamento dos conceitos básicos já conhecidos e possibilitando a busca e compreensão de novas idéias e valores. Usar o computador com essa finalidade requer a análise cuidadosa do que significa ensinar e aprender, demanda rever a prática e a formação do professor para esse novo contexto, bem como mudanças no currículo e na própria estrutura da escola. 
O QUE É INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO? 
O termo "Informática na Educação" tem assumido diversos significados dependendo da visão educacional e da condição pedagógica em que o computador é utilizado.
( ... ) O termo "Informática na Educação" significa a inserção do computador no processo de aprendizagem dos conteúdos curriculares de todos os níveis e modalidades de educação. Para tanto, o professor da disciplina curricular deve ter conhecimento sobre os potenciais educacionais do computador e ser capaz de alternar adequadamente atividades tradicionais de ensino-aprendizagem e atividades que usam o computador.
No entanto, a atividade de uso do computador na disciplina curricular pode ser feita tanto para continuar transmitindo a informação para o aluno e, portanto, para reforçar o processo tradicional de ensino (processo instrucionista), quanto para criar condições para o aluno construir seu conhecimento por meio da criação de ambientes de aprendizagem que incorporem o uso do computador (processo construcionista). 
AS ABORDAGENS INSTRUCIONISTA E CONSTRUCIONISTA 
O computador pode ser usado na educação como máquina de ensinar ou como máquina para ser ensinada. O uso do computador como máquina de ensinar consiste na informatização dos métodos de ensino tradicionais. Do ponto de vista pedagógico esse é o paradigma instrucionista. Alguém implementa no computador uma série de informações e essas informações são passadas aos alunos na forma de um tutorial, exercício-e-prática ou jogo. Além disso, esses sistemas podem fazer perguntas e receber respostas no sentido de verificar se a informação foi retida. Essas características são bastante desejadas em um sistema de ensino instrucionista já que a tarefa de administrar o processo de ensino pode ser executada pelo computador, livrando o professor da tarefa de correção de provas e exercícios.
Embora, nesse caso o paradigma pedagógico ainda seja o instrucionista, esse uso do computador tem sido caracterizado, erroneamente, como construtivista, no sentido piagetiano, ou seja, para propiciar a construção do conhecimento na "cabeça" do aluno. Como se o conhecimento fosse construído por meio de tijolos (informação) que devem ser justapostos e sobrepostos na construção de uma parede.
Nesse caso, o computador tem a finalidade de facilitar a construção dessa "parede", fornecendo "tijolos" do tamanho mais adequado, em pequenas doses e de acordo com a capacidade individual de cada aluno.
Com o objetivo de evitar essa noção errônea sobre o uso do computador na educação, Papert denominou de construcionista a abordagem pela qual o aprendiz constrói, por intermédio do computador, o seu próprio conhecimento. Ele usou esse termo para mostrar um outro nível de construção do conhecimento: a construção do conhecimento que acontece quando o aluno constrói um objeto de seu interesse, como uma obra de arte, um relato de experiência ou um programa de computador. Na noção de construcionismo de Papert, existem duas idéias que contribuem para que esse tipo de construção do conhecimento seja diferente do construtivismo de Piaget. Primeiro o aprendiz constrói alguma coisa ou seja, é o aprendizado por meio do fazer, do "colocar a mão na massa". Segundo, o fato de o aprendiz estar construindo algo do seu interesse e para o qual ele está bastante motivado. O envolvimento afetivo torna a aprendizagem mais significativa.
Entretanto, na minha opinião, o que contribui para a diferença entre essas duas maneiras de construir o conhecimento é a presença do computador - o fato de o aprendiz estar construindo algo usando o computador (computador como máquina para ser ensinada). Nesse caso, o computador requer certas ações que são bastante efetivas no processo de construção do conhecimento.
Quando o aluno interage com o computador passando informação para a máquina se estabelece um ciclo - descrição-execução-reflexão-depuração-descrição - que é o propulsor do processo de construção do conhecimento. Por exemplo, para programar o computador para resolver um problema o aluno deve ser capaz de passar a idéia de como resolver o problema na forma de uma seqüência de comandos da linguagem de programação. Isso significa, a descrição da solução do problema usando comandos da linguagem de programação.
O computador, por sua vez, realiza a execução desses procedimentos. O computador age de acordo com cada comando, apresentando na tela um resultado na forma de um gráfico. O aluno olha para a figura que está sendo construída na tela e para o produto final e faz uma reflexão sobre essas informações.
O processo de refletir sobre o resultado de um programa de computador pode acarretar uma das seguintes ações alternativas: ou o aluno não modifica o programa porque as suas idéias iniciais sobre a resolução daquele problema correspondem aos resultados apresentados pelo computador e, então, o problema está resolvido; ou depura o programa quando o resultado é diferente da sua intenção original. A depuração pode ser em termos de alguma convenção da linguagem de programação, sobre um conceito envolvido no problema em questão (o aluno não sabe sobre o ângulo), ou ainda sobre estratégias (o aluno não sabe como usar técnicas de resoluções de problemas).
A atividade de depuração é facilitada pela existência do programa do computador. Esse programa é a descrição das idéias do aluno em termos de uma linguagem simples, precisa e formal. Essas características disponíveis no processo de programação facilitam a análise do programa de modo que o aluno possa achar seus erros (bugs).
O processo de achar e corrigir o erro constitui uma oportunidade única para o aluno aprender sobre um determinado conceito envolvido na solução do problema ou sobre estratégias de resolução de problemas. O aluno pode também usar seu programa para relacionar com seu pensamento em um nível metacognitivo. Ele pode analisar seu programa em termos de efetividade das idéias, estratégias e estilo de resolução de problema. Nesse caso, o aluno começa a pensar sobre suas próprias idéias (abstração reflexiva).
Entretanto, o processo de descrever, refletir e depurar não acontece simplesmente colocando o aluno em frente ao computador. A interação aluno-computador precisa ser mediada por um profissional que conhece os potenciais do computador, tanto do ponto de vista computacional, quanto do pedagógico e do psicológico. Esse é o papel do professor ou agente de aprendizagem. Além disso, o aluno como um ser social, está inserido em um ambiente social que é constituído, localmente, pelos seus colegas e, globalmente, pelos pais, amigos e mesmo a sua comunidade. O aluno pode usar todos esses elementos sociais como fonte de idéias, de conhecimento ou de problemas a serem resolvidos por intermédio do uso do computador.
O ciclo descrição-execução-reflexão-depuração-descrição que se estabelece na programação também acontece quando o aluno usa o computador para criar um texto usando um processador de texto, quando utiliza o computador para desenvolver uma multimídia por meio de um software de autoria, ou mesmo uma planilha ou criar um banco de dados. Ou seja, esse ciclo acontece sempre que o aluno interage com o computador usando software abertos onde é o aluno que transmite informação para a máquina e não a máquina para o aluno. 
IMPLICAÇÕES DO CONSTRUCIONISMO
NA MUDANÇA DA ESCOLA 
A abordagem que usa o computador como meio para transmitir a informação ao aluno mantém a prática pedagógica vigente. Na verdade, o computador está sendo usado para informatizar os processos de ensino que já existem. Isso tem facilitado a implantação do computador na escola, pois não quebra a dinâmica por ela adotada.
Além disso, não exige muito investimento na formação do professor. Para ser capaz de usar o computador nessa abordagem basta ser treinado nas técnicas de uso de cada software. No entanto, os resultados em termos da adequação dessa abordagem no preparo de cidadãos capazes de enfrentar as mudanças que a sociedade está passando são questionáveis. Tanto o ensino tradicional quanto sua informatização preparam um profissional obsoleto.
Por outro lado, o uso do computador na criação de ambientes de aprendizagem que enfatizam a construção do conhecimento apresenta enormes desafios. Primeiro, implica em entender o computador como uma nova maneira de representar o conhecimento. Segundo, requer a análise cuidadosa do que significa ensinar e aprender, bem como demanda rever o papel do professor nesse contexto. Terceiro, a formação desse professor envolve muito mais do que prover o professor com conhecimentos sobre computadores. O preparo do professor não pode ser uma simples oportunidade para passar informações, mas deve propiciar a vivência de uma experiência. É o contexto da escola, a prática dos professores e a presença dos seus alunos que determinam o que deve ser abordado nos curso de formação. Assim o processo de formação deve oferecer condições para o professor construir conhecimento sobre as técnicas computacionais e entender por que e como integrar o computador na sua prática pedagógica.
Além disso, a mudança na escola envolve muito mais do que formar o professor. Mudanças na formação deste profissional não podem ser vistas como único fator desencadeador de mudança na escola como um todo. Outros aspectos também devem ser revistos, tais como: a forma como o currículo afeta o desempenho do professor e a maneira como a gestão escolar interfere na sala de aula. É necessário que os elementos atuantes na escola - alunos, professores, administradores e pais - sejam capazes de superar barreiras de ordem pessoal, administrativa e pedagógica, com o objetivo de ultrapassar uma visão fragmentada de ensino a fim de alcançar uma concepção interdisciplinar voltada para o desenvolvimento de projetos específicos de interesse dos alunos e da comunidade. Além disso, a escola deve criar condições para que o aluno saiba recontextualizar o aprendizado, integrar a experiência vivenciada na sua formação com a sua realidade de vida, compreendendo suas potencialidades e compatibilizando-as com os objetivos profissionais que pretende alcançar.
Portanto, os desafios na implementação do computador na escola, objetivando uma mudança educacional são enormes. No entanto, se eles não forem atacados corremos o risco de perpetuarmos uma escola que já é obsoleta. Só que agora, ela será obsoleta porém, usando a informática.

José A. Valente
NIED-UNICAMP e CED-PUCSP

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